quinta-feira, 16 de abril de 2009

SONETO

Gilberto Wallace Battilana

Continuas mulher, ainda que que no meu verso
eu te componha neste outro universo
onde suspensos sobre o rio do tempo
dançamos o tango das nossas vidas.

És musa e tema, és do poema a palavra e a razão,
és o corpo que moldo com as mãos na cama,
e continuas a ser a imagem que me vence a expressão
sem que nesta união eu atinja o gozo da posse

que está sempre além do que a palavra encobre,
e reconheço a minha poesia fraca e pobre
ante a fortaleza e o ouro da tua beleza.

Tu, que és ideia e mulher, e te pões à minha frente,
desafiante e desnuda para que te consagre no lençol
deste papel onde o que fica é o fracasso do escrevente.

SONETO

SONETO

domingo, 22 de março de 2009

quarta-feira, 4 de março de 2009

PRIMEIRA LIÇÃO DE FÍSICA

PRIMEIRA LIÇÃO DE FÍSICA

poema de Gilberto Wallace Battilana

Só uma mulher pode preencher a saudade de outra.
Um corpo ocupando o mesmo lugar de outro
numa lei da física amorosa, sensual,
mais apurada que a clássica ou a quântica.
Essa nem Kepler, Newton, Heisenberg ou Cavendish, conheciam.
Dois corpos se entrelaçando, jamais se confundindo,
deixando de ser uno ou abolindo a individualidade.
O sentimento nos une, nus, sem nos despir da identidade.
É impossível ser o outro, seus pensamentos e desejos.
Por mais que nos entreguemos num beijo,
é-nos interdito nos abandonar.
Eu serei sempre eu, até a morte.
Ela será sempre, até a morte, ela.

domingo, 1 de março de 2009

POEMAS REUNIDOS

POEMAS REUNIDOS
poema de Gilberto Wallace Battilana

Este blog de poemas reunidos
em que as palavras se perdem de seu sentido,
por mais que o que se queira dizer seja pressentido
num acordar sussurrante de errantes riscos no papel,
prosseguindo, sem saber o caminho
entre lembranças tristes, alegres, e copos de vinho.
Escrever é o que há de mais sensível,
basta um hesitar distraído para perder,
mesmo continuando o que estava a ser feito,
já não alcançará o mesmo efeito.
É um navegar nas águas do mesmo mar,
ignorando até onde se vai nessa corrente impermanente e singular.

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009

POEMA NEURO(TICO)LÓGICO

POEMA NEURO(TICO)LÓGICO
poema de Gilberto Wallace Battilana

A plasticidade dos meus neurônios do hemisfério
esquerdo, aliada, por um sortilégio, à interconexão
entre a região occípito temporal ventral esquerda
e as várias áreas, mesmo distantes, processadoras em paralelo,
me propõem esse balé com palavras significantes,
imagens abstratas, formas variantes.
Ora, dirás, ler metáforas, por certo estás louco,
e a minha arquitetura neuronal levanta-se como uma catedral
buscando formas cada vez mais raras e essenciais
em todos os sinais, signos, ícones, símbolos, índices,
avança por ramais de mensagens subliminares,
num complexo composicional exercício semiótico.
É lutando para compreender o mundo e o céu azul
que o poeta, tríade humana, se faz neurótico
para transcender até chegar ao que é
em cada poema, feixe de traços distintivos
registrados numa tomografia computadorizada.
Não quero mais o lápis, não mais o papel,
quero a ressonância magnética, que a poesia
em vez de escrita, seja uma figura espectroscópica.

quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009

CONCURSOS

poema de Gilberto Wallace Battilana

Convidados a exibir-nos em concursos,
como nos circos são mostrados os ursos
amestrados, fazemos das palavras piruetas,
tais palhaços a mostrar caricatas caretas.
Vejamo meu ornamental salto métrico,
minhas reticências, o meu hemistíquio estético.
E aqui, a minha acrobacia rítmica,
o globo da morte metafórico, minha força anímica.
A platéia aplaude. Acendem-se as luzes pretas,
aparece no palco o prestidigitador e faz uma mesura
mágica, criando um encadeamento de borboletas
que voejam pelas jubas dos leões na jaula hermética,
onde o domador se isola como numa cesura
no soneto, espetáculo malabarístico da poetica.

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

EFÊMERO

Quando penso que esta mesa,
esses livros, me sobreviverão,
que essas coisas efêmeras
alcançarão uma duração maior
que a minha existência,
constato a minha verdadeira dimensão.
Sei, há a eternidade,
mas sou mais um, entre tantos,
subjugados pela mortalidade,
buscando a beleza de uma verdade
na fantasia de cada dia.

DE QUE VALE

poema de Gilberto Wallace Battilana

De que vale um coração
se não pulsa por amor.
De que vale estar desperto,
se está frio, está deserto.
De que vale estar atento
a cada pensamento,
se não pulsa com amor,
se está pálido, incolor,
dentro do corpo, fútil,
como numa casa escura
um velho móvel inútil?

GÁS CARBÔNICO

poema de Gilberto Wallace Battilana

Queria tanto recordar meus sonhos.
Acordo, e só o vazio me acolhe.
Se recordasse meus sonhos, suponho,
seria mais feliz. Reponho os óculos
sobre o nariz e sigo o poema que ainda não fiz.
A minha vida é despida de qualquer fantasia.
Só tenho a mim e ao dia,
seus relógios e jornais,
e nada mais.
O poema é o meu protesto,
único manifesto que me permite o mundo,
cartaz que levanto solitário
frente ao tumulto que me afoga em gás carbônico
entre homens que o tempo apressa, catatônicos.
Em cada verso invento um sentido,
assim alcanço a percepção do meu limite,
os fatos existenciais não acontecem,
e a minha vida desaparece,
só as persistentes palavras permanecem
acesas, avançando pela noite do futuro,
paisagens de uma arquitetura a se fazer.
Como nomear o não visto, o só pensado?
A poesia nem liga para o obscuro,
continua, única e eterna.
Não a minha, ou a tua, mas a de uma corrente
permanente que enlaça o tempo, o espaço,
o pensamento, na mesma centelha de um invento.
Por mais que me ataquem as intempéries violentas
da vida, matenho-me de pé contra a tormenta.
Nem todos lembram a senha do Abre-te Sésamo da poesia,
é necessário repeti-la dia a dia e lutar com palavras e sonhos
nas longas jornadas das noites, só com a luz dos nosso olhos,
de sombra em sombra.



terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

UM AMOR ACABADO

poema de Gilberto Wallace Battilana

Por que não acabará o nosso amor
se até as estrelas desaparecem do universo?
E da nada adiantarão os meus versos
quando partires. Mas seja para onde for
que vás, ficará gravada a tua lembrança
no mapa da memória do meu coração,
nele sinalizada a felicidade que não se alcança.
Assim pensava eu antes da realidade da separação.
Mas a vida continua, confusa e sempre renovada,
ainda que, como pombas se vão as amadas.
O amor não tem o rigor de uma verdade, é relativo,
nem assim desistirei de amar enquanto vivo.

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

ELEGIA

poema de Gilberto Wallace Battilana

Não se repetirão as nossas noites.
Deitado na escuridão lembro cada contorno
do teu corpo e tua respiração, leve e breve.
Teus cabelos, onda revolta e negra
onde sufocava o meu rosto no prazer,
se levanta na minha lembrança
afastando toda a esperança
de que eu ainda possa ser feliz.
O teu nariz, desenho do mais perfeito perfil.
Tua boca, fruto de mutante sabor
provado pelo meu amor.
O que amei, amo, em ti e foi meu,
não sei em que momento se perdeu,
recrudesce sua dor nesta noite fria
em que me abrigo na solidão, no uísque e na elegia.

domingo, 1 de fevereiro de 2009

UMA VISÃO DO POEMA

Poema de gilberto wallace battilana

Contemplo o poema, enfeitiçado momento desvendado
que permanece obscuro mesmo depois de revelado.
Contemplo suas palavras, seus versos, à minha frente,
que nascem de mim sem que conheça a vertente.
Paciente de um profundo processo inconsciente,
acompanho a minha mão no seu anotar intermitente,
artesã que não descansa antes de pensá-lo acabado.
Então, já não é meu, como se nunca o tivesse tocado.
Assim, a navgar na sombra desta corrente,
não por curiosidade ou dúvida impermanente,
mas com a certeza iminente de que o verso abandonado
será esquecido como coisa sem valor, inconsequente,
persisto na armação deste quebra-cabeças intrincado
que a morte assiste,imperturbável, a meu lado.

quinta-feira, 15 de janeiro de 2009

O POETA E A ATRIZ

poema de Gilberto Wallace Battilana

Leste os meus poemas em voz alta
mudando o quarto em ribalta
onde eras a bela e principal atriz.
Leste-os com a emoção de quem diz
uma frase de amor ou afirma uma verdade
sem saber que tudo é mentira, a realidade
os meus poemas, o amor, as nossas vidas
para quem, igual a mim, dá a vida por vencida.
Vieste de um desconhecido lugar, e distante
para seres quem, irmã, amiga, amante?
Quem pode predizer o futuro, diante
do qual, mortal, sinto-me indefeso?
Ainda que me pesem os anos, surpreso
frente a cada dia, trago o coração aceso.

quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

O poema vem sempre depois

poema de Gilberto Wallace Battilana

Quando escrevi meu amor,
não te amava mais.
O poema vem sempre depois.
Talvez o que eu ame seja a beleza
que a palavra empresta ao sentimento.



A citação do dia:
"A poesia não é uma liberação de emoções, mas fuga das emoções; não é uma expressão da personalidade, mas uma fuga da personalidade".


sexta-feira, 9 de janeiro de 2009

NÃO POSSO MORRER HOJE

poema de Gilberto Wallace Battilana

Não posso morrer hoje,
tenho compromissos a que não posso faltar,
comprimidos a engolir,
livros para comprar.
Preciso correr no Parque
quarenta minutos,
me fez a prédica a médica.
Tenho hora marcada com o dentista,
com o cardiologista,
com quem mais, onde botei a lista?
O meu dia está cheio,
e a minha vida, espero, pelo meio.
A refeição está combinada,
almoço camarão com aipim,
que a amada vai fazer pra mim.
E um Andanza Reserva 89,
que assim a terra se move.
Depois do almoço
não venham à minha casa,
é hora de eu criar asas
fazendo amor,
não antes de um panatela e um vinho do Porto,
que não estou morto.
Não, não posso morrer hoje,
nem pensem nisso.
Morram os que não tem o compromisso
de escrever mais um poema,
ou ir ao cinema.


A citação do dia:
"O tempo só tem uma realidade: a do instante". Gaston Bachelard

quinta-feira, 8 de janeiro de 2009

A BELA ADORMECIDA

poema de Gilberto Wallace Battilana

Na nudez do teu sono te descubro
e murmuras. Serão palavras tuas
ou as vozes de um sonho?
Imóvel, avanças debaixo de outro céu.
A fragilidade do teu abandono
me imobiliza no sonho que és no teu sono.
Sobre a dobra do teu cotovelo
repousas o teu rosto
no enovelado dos teus cabelos
e tens a paz de um sol posto


A citação do dia:
"O pior que pode acontecer a um escritor não é muitas pessoas dizerem mal dele, é ninguém dizer nada". Nicolás Boileau









quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

OFERENDA

poema de gilberto Wallace Battilana

Soubesse tocar violino,
usar pincéis, cinzéis,
pudesse não temer as minhas paixões
ou simplesmente fazer entenderes e rir
das coisas vulgares que me acontecem.
Acreditarás que um verso pode me fazer chorar?
Uma vida tem seus segredos, prazeres, medos.
E o tempo se esconde em cada noite
para não mais voltar.
É difícil ser homem.
Os pensamentos me consomem.
Se o poema fosse a minha realidade
não me absorveria a perplexidade.
Mesmo com todo o cuidado
as palavras jamais alcançam a pureza,
congeladas de citações e significados.
Eu sei, tudo já foi dito e escrito.
Condenado ao finito compartir deste rito,
exausto de versos aos quais volto,
não tenho mais onde guardar poemas,
tantos os que escrevi,
te ofereço este, guarda-o,
com ele guardarás a minha vida.


A CITAÇÃO DO DIA:
"A poesia vem à luz por meio de tentativas, não de previsões". C. Pavese

terça-feira, 6 de janeiro de 2009

UM CORPO, O POEMA

Poema de Gilberto Wallace Battilana
A minha mão entre a tua saia e a tua pele
me causa a mesma sensação de quando roço o papel
acariciando o poema. O mais puro prazer sensual
se faz pensamento em busca da beleza
numa contemplação atenta e inquieta,
e beijo a tua boca, tateio o teu seio,
procurando no poema o veio racional.
E avanço, num jogo duplo, desdobramento natural
no qual nem o que sobra me é alheio,
quero mais, sem desistência,
minha vontade perseguindo o verso
e revelando a mulher, paradoxal
fotografia captada pelo poema numa aparente
incoerência,
regras e estruturas, ritmos e imagens, desenham
a descoberta da arquitetura do teu corpo, esfinge
de cristal.



A citação do dia

"A poesia é indispensável. Se eu ao menos soubesse para quê.
Jean Cocteau

Poemas na parede


Poema de Gilberto Wallace Battilana

Os poemas que não escreverei
estão dependurados nas paredes.
Eu os examino com a distância da impossibilidade,
sem ousar torná-los realidade.
Diante do meu olhar passeia
uma aranha na sua teia.
Quisera eu a firmeza desse fiar
para cada poema escrever.
São tantos a anotar
não posso me deter.
Esses permanecem na parede
como são belos na inaginaçao
mais que poemas
são desejos de perfeição.




A citação do dia

"Um poeta é um homem que possui a dádiva de dominar a sua loucura e conduzi-la" Herman Broch